quarta-feira, 14 de julho de 2010

Dos conceitos prévios

Dos conceitos prévios


Uma das formas da aprender é experimentando. A angústia que precede as notícias que sabemos que receberemos, mas das quais desconhecemos o conteúdo assemelha-se a um soco na boca do estômago.
Fisicamente falando, nunca tomei um, mas já tomei vários, não falando fisicamente. Ela se parece também com aquela que experimentamos em relação ao que não conhecemos. E a angústia é tanta e tal que se criou, inclusive, uma vida após a morte, talvez na esperança de que tal ilusão facilitasse o ter que lidar com esse mistério químico. Num instante estamos vivos e no instante seguinte... Nada. Sem encontrar explicação física, Deus foi chamado a nos ajudar a carregar o fardo, pois foi, ainda é, insuportável para os humanos pensarem-se sós no universo.

Ainda gasto fosfato com o físico e o metafísico. Digo ainda porque não estou bem certa se deveria ter desistido ou não. Enquanto não encontramos respostas seguimos buscando, dentro e fora de nós, até que as que estão fora entrem e comecem a fazer parte do que nos pertence, tanto e de tal modo que vira nosso. Depois de nosso colocamos no baú e quando queremos respostas reviramos tudo lá dentro tentando achar uma. Às vezes não está lá, mas é bom e confortável quando está. Quanto maior o baú das experiências menos angústias sentimos, ou pelo menos assim deveria ser. As coisas vividas fazem com que ganhemos a capacidade de não nos importar tanto com aquilo que não importa, em outras palavras, diminuem a angústia. Mas há o baú de perguntas e esse só aumenta a angústia. Os dois baús crescem com o tempo, o de conhecimentos e experiências e, na mesma proporção, o de perguntas. É nosso paradoxo, perguntar mais quanto mais se sabe.

Nietzsche disse: “Deus está morto”. Como se fosse possível algo não físico morrer. Acho que ele queria dizer que o homem havia encontrado respostas fora da transcendência de Deus para suas angústias. Havia acordado para dentro dele mesmo e isso o ajudava a achar suas respostas no próprio baú. Entenderam de outro modo. Cada um usa seus próprios preconceitos para interpretar o que ouve. Assim funciona o mecanismo da palavra expressa. Ela não volta para a boca e, depois de dita, quem a ouve pode entender e repetir como quiser. Pode dar confusão. Normalmente dá. É humano, demasiado humano.

Deus do alto de sua divindade, essa também humana, não resistiu e disse: “Nietzsche está morto”. Fato. O corpo morreu, mas Nietzsche não. Morre a carne ficam as palavras. O que reforça a tese de que estamos também no que dizemos. Volto a insistir, palavra é vida, seja a de Deus, seja a humana. Uma coisa que me intriga é porque Deus em pessoa nunca falou comigo. O mais provável é que talvez ele não queira que eu acredite nele. Não sei se obedeço... É o meu paradoxo.

O morto, se é que morto fala, não queria interromper o diálogo e disse: “Nietzsche é Deus.”
Os viventes gostam de falar. Falam tanto que colocam palavras na boca dos mortos. O que para eles não faz a menor diferença. O problema está quando colocam palavras na boca dos vivos. Aí começam os mal-entendidos, por isso não se deve usar a palavra levianamente.

...

A angústia veio antes de Deus que foi criado, precisamente, com vistas a diminuí-la.
A filosofia é feita e refeita, precisamente, para buscar respostas às angustiantes perguntas sem respostas. Tanta palavra dita e permanece a angústia. Nem Deus, nem Nietzsche, ambos enganados e vivos. E como!